UMA JANELA PARA O FUTURO

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O trem desliza em sua displicência pela paisagem indiferente. Contemplo, sentado junto à janela aberta, a brisa lambendo a pele do meu rosto e os meus cabelos que nem se importam. Lá fora, tudo passa, tanto mais rápido quanto mais perto. As montanhas, azuladas pela distância, e as nuvens parecem não ter nenhuma pressa e ficam ali, olhando nos meus olhos, por muito tempo, enquanto o trem, sacolejando suavemente, como que embalando os passageiros, rompe as distâncias, avança, no afã de deixar tudo para trás.

A literatura passa pela janela como a montanha azulada lá longe. Recusa-se a ficar para trás. É uma nuvem que acompanha o trem, lá em cima, institivamente, contra a corrente de vento. Espia a janela — quem é o sujeito? A nuvem ou a janela? — Quanto a mim, sou passageiro. Do trem. Da vida. Do tempo. Quando chegaremos à próxima estação?

O livro espalha vidas pelos vãos das janelas do trem. Ele não dorme no tempo, nem envelhece, nem morre. Esses passageiros, distraídos, não o compreendem. Chamam de ficção as verdades que eles contam. Dizem que não têm concentração suficiente para entrarem neles e cavalgarem em suas páginas, montados em cavalos alados. Fragmentam-se em vídeos curtos e vazios, misturados na tela nervosa do telefone celular. A vida se despedaça — se torna em miniaturas interrompidas.

O livro anuncia a alvorada! É um amanhecer que desponta a cada página virada, a cada frase que se desnuda ante os olhos do leitor. O livro sonda as almas. Cada palavra transforma — fere, cura, esboteia, afaga. O livro — bendito seja! — revela o leitor a si mesmo, promove o ansiado encontro entre as ilusões do tempo de cada um — passado, presente e futuro. O livro, esse mágico sem cartola, é atemporal.

O livro é a janela aberta nessa longa viagem no trem da vida. A brisa que lambe, a paisagem que passa, a montanha que fica, a nuvem que segue, o ritmo e a mágica. É o anúncio da alvorada de cada um. O livro é o estribo e a sela que nos permitem cavalgar nos cavalos alados. Então, quando cavalgamos, não dormimos no tempo, nem envelhecemos, nem morremos.

Junte-se ao Clã!

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